O Herpesvirus Equino (EHV’s) são patógenos extremamente competentes dos equídeos ao longo de todo mundo. Estão divididos em 5 tipos (EHV-1 à EHV-5) capazes de infectar os equinos domésticos, e os EHV-6 à EHV-9, que infectam equídeos de vida selvagem. Nas populações domésticas, o EHV-1 e EHV-4 (alfa herpesvirus) são os patógenos mais importantes e também mais estudados, capazes de desenvolver doenças respiratórias, neurológicas e abortamento. Os gama herpesvirus (EHV-2 e EHV-5) ainda foram pouco estudados, mas acredita-se que sejam capazes de desenvolver doenças respiratórias e oculares, sendo este último ainda o patógeno responsável pela fibrose multinodular pulmonar equina. Esta família de vírus é responsável ainda por efeitos imunosupressivos nos equinos, predispondo ao aparecimento de novas doenças ou ainda a cronificação destas.
EHV-1 e EHV-4 estão intimamente relacionados, porém são geneticamente e antigenicamente distintos, promovendo perfis diferentes de doença. EHV-1 é um patógeno principalmente dos cavalos domésticos, porém existem evidências de que possa acometer também os bovinos, camelos e cervídeos. O EHV-4 é um patógeno exclusivo dos equinos domésticos. Outra diferença entre estes vírus é que o EHV-1 infecta uma grande variedade de células, incluindo as do epitélio respiratório, endoteliais, neuronais e linfoides. Já o EHV-4 possui tropismo principalmente para as células epiteliais e neuronais, além de possuir potencial limitado de invasão às células linfoides e endoteliais.
Patogenia:
A infecção ocorre pela inalação de vírus presentes em aerossóis, os quais invadem as células do epitélio respiratório. A replicação viral nestas células pode ser assintomática ou ainda acompanhada de sinais de doença respiratória. Ao assumirem o ciclo lítico, os vírus atravessam então a membrana basal e infectam linfócitos T, se disseminando por todo o organismo. Esta é a fase chamada de viremia, que geralmente ocorre de 4 à 10 dias após a infecção. Em contato com o endotélio vascular, invadem estas células promovendo vasculite, trombose e necrose tecidual. Os danos promovidos ao endométrio, os quais resultam em abortamento, e ao sistema neurológico (gerando mieloencefalopatia), estão diretamente associados à vasculite e necrose descritas anteriormente.
Após terem penetrado pelo epitélio respiratório, os vírus podem também assumir o ciclo de latência, invadindo células nervosas do gânglio do trigêmio por migração retrógrada axonal a partir dos neurônios sensitivos etmoidais e permanecendo dentro delas por períodos indeterminados. Estes vírus podem se reativar invadindo células endoteliais do tecido nervoso, reiniciando um novo ciclo lítico sem que necessariamente tenha ocorrido uma nova infecção.
Ciclos lítico e latente dos herpevirus 1 ao infectarem os equídeos. Os vírus podem assumir o estado latente ou ativado (lítico) em qualquer momento após terem infectado o equino.
Sinais clínicos:
As infecções por EHV-1 podem se manifestar por doenças respiratórias, abortamentos no terço final da gestação (sem sinais prévios), morte neonatal e mieloencefalopatias. As manifestações nervosas dependem diretamente do local acometido pelo vírus, porém observa-se maior ocorrência de sinais clínicos associados às lesões caudais ao espaço lombossacro, resultando em ataxia e paresia de membros pélvicos, atonia de cauda, bexiga, retenção e/ou incontinência urinária, atonia e insensibilidade de região perianal e vulvar. As infecções por EHV-4 geralmente são restritas ao epitélio respiratório, promovendo secreções nasais, sinusite, pneumonite e até broncopneumonia bacteriana secundária.
O período de infecção inicial pode ser assintomático ou ainda ser evidenciado por febre, hiporexia, descargas nasais (serosas à mucopurulentas), conjuntivite, tosse, apatia. As análises hematológicas evidenciam inicialmente linfopenia e neutropenia seguidas de leucocitose. Ao se recuperarem dos sinais respiratórios, que são autolimitantes, estes animais podem desenvolver síndrome de baixo desempenho e sensibilidade bronquial inespecífica.
Diagnóstico:
O diagnóstico na rotina clínica é presuntivo e baseado nos sinais clínicos, testes sorológicos e eliminação das possibilidades de serem outras doenças análogas. O diagnóstico definitivo geralmente é obtido por meio de imunofluorescência, reação em cadeia da polimerase (PCR) e isolamento viral, utilizando-se amostras de tecidos ou suabes nasais. O líquido cerebroespinhal também pode ser utilizado no caso das manifestações neurológicas, podendo este apresentar aspecto amarelado (xantocromia) característico da doença.
Diagnóstico diferencial:
- Influenza
- Garrotilho
- EPM
- DIVA/ORVA
Tratamento:
O tratamento é sintomático e envolve o uso de anti-inflamatórios não esteroidais como a flunixina meglumina (1,1 mg/kg, iv, 1xdia, 5d) ou fenilbutazona (4 mg/kg, iv ou oral, 1xdia, 5d) firocoxibe (0,1 mg/kg, oral, 1xdia, até 20 dias) e dipirona (0,02 mg/kg, iv, 2xdia em caso de febre), DMSO 10% (1 g/kg, iv, 1xdia, 3 dias) e dexametasona (0,2 mg/kg, iv, 1xdia, por 3d) em casos neurológicos e antibióticos nos casos de infecções respiratórias bacterianas secundárias. Higiene, conforto ambiental e boa alimentação também contribuem para a melhora clínica dos animais, pois minimizam o estresse dos animais convalescentes.
Prevenção:
Animais acometidos devem ser mantidos em isolamento dos demais por ao menos 21 dias, de forma a se evitar a disseminação viral. Fetos e anexos fetais provenientes de abortamento devem ser incinerados e o local deve ser isolado dos demais animais, pois são altas fontes de contaminação. Vacinação de éguas prenhes é recomendada no quinto, sétimo e nono mês de gestação. Potros podem ser vacinados aos 6 meses, com reforço 30 dias e 6 meses após a segunda dose. Cavalos adultos devem ser vacinados anualmente. Treinamento de funcionários quanto as importâncias de medidas de higiene também fazem parte das estratégias de controle.
Considerações em saúde pública:
Não existem evidências de que os herpesvirus equinos possam acometer os seres humanos.
Referências:
1. SELLON, D.C. LONG, M.T.L. Equine Infectious Diseases, 2nd Ed. Elsevier, p.475-494, 2014.
2. SPRAYBERRY, K.A. ROBINSON, N.E. Robinson’s Current Therapy in Equine Medicine, v.7. Elsevier, p.336-340, 2014.
3. DUNOWSKA, M. A review of equind herpesvirus 1 for the veterinary practioner. Part A: clinical presentation, diagnosis and treatment. New Zeland Veterinary Journal 62(4): 171-178, 2014.
4. DUNOWSKA, M. A review of equind herpesvirus 1 for the veterinary practioner. Part B: pathogenesis and epidemiology. New Zeland Veterinary Journal 62(4): 179-188, 2014.
5. GUANGGANG, M.A. AZAB, W, OSTERRIEDER, N. Equine herpesviruses type 1 (EHV-1) and 4 (EHV-4) – Masters of co-evolution and a constant threat to equids and beyond. Veterinary Microbiology 167: 123-134, 2013.